E o futuro faz-se.
O que há de unificador entre o terror e a comédia é a desproporcionalidade.
Um vírus tem colocado o mundo inteiro em sobressalto. Milhares de homens engravatados levam, a cada minuto, as mãos à cabeça. E justificadamente. O sistema que criámos para governo da vida coletiva não deixa de responder ao bater das asas de uma borboleta.
Há um fio condutor, governante do nosso desespero, que é contagiante e involuntário como o riso. Temos todos nas mãos, e apenas, a ponta do laço daquele outro a que recusamos dar as mãos. Construímos redes interligadíssimas de desconfiança, ligações fracas que nos apodrecem nos dedos segundos depois do toque. Vivemos em persistente precariedade emocional.
Corremos o risco de enterrar qualquer esperança de humanidade ao vermos no outro o prenúncio de um contágio.
O vírus tem as suas implicações evidentes, médicas e lúcidas, que arquivaremos em bases de dados e imagens baças de pulmões difusamente infiltrados. Mas quando o vírus se for, e com ele os seus rótulos e cautelas fundamentais, o que ficará de humano?
Há, todavia, o futuro. E o futuro faz-se.
Pedro Eduardo Ramos
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