Finalmente o rio desaguou.


uma febre trémula abate-se
na substância da carne

um arrepio que nasce
nas fontes da cabeça
morrendo no estuário
da espinha vertebral
um rio de amor sem pressa

vou para qualquer parte
sítios de fechar os olhos
mar e multidão e abraçar-te

o murmúrio do medo
não me agarra o braço
a cidade jamais cala
o seu segredo firme

na tensão das cordas vocais
abre-se a porta
o estuário ansioso
da espinha vertebral

finalmente o rio desaguou 

olhos lavados
desarmados
na ânsia de regressos
a espuma das mãos
num desabraço
aconchegado

na tensão das cordas vocais
abre-se a porta
uma febre trémula abate-se
na substância da carne
enlaçamos as mãos:

"faremos filhos
e eles serão livres"

finalmente o rio desaguou



Cartaz de Maria Helena Vieira da Silva, a pedido de Sophia de Mello Breyner Andresen. 25 de abril de 1974.














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